Randy Faz

Outro dia eu recebi uma ligação de uma das agências caça talento com as quais tenho contato. Eles queriam saber se eu não queria fazer uma entrevista de trabalho, algo assim segundo eles imperdível. Oportunidade única, uma marca de bolsas incríííível. Eu para todos os efeitos estou muito feliz no meu emprego atual e realmente não tinha muito interesse em sair fazendo entrevistas. Mas enfim, como explicar? É como prestar atenção em comercial das Casas Bahia, é o tal efeito da palavra “imperdível!” com exclamação e tudo.

E lá fui eu. A entrevista era no próprio showroom. Três andares inteiros num prédio na Quinta Avenida, coisa assim bem impressionante. A marca para ser sincera eu nunca tinha ouvido falar mas de fato eles são meio conhecidos. A diretora de recursos humanos aparece com catálogos debaixo do braço para me mostrar. Em cinco minutos ela faz um resumo, a tal marca foi criada na Cálifornia e agora eles estão mudando o escritório para NY. O diretor de arte chamado Randy não quer mudar para NY e eles estão procurando alguém para tomar o lugar dele. A vaga oferece vários desafios e a pessoa escolhida terá que ser um curinga que possa fazer várias coisas diferentes, não é só sentar e fazer layouts. “O que você acha?” Ela pergunta. Eu acho ótimo. Hoje em dia eu dirijo as sessões de foto, faço layouts, dirijo a produção de todo o departamento, faço retoque nas fotos se necessário, vou na gráfica quando precisa, organizo e controlo o orçamento, vou nas reunões de marketing. Acho que é mais do sentar e fazer layout. “Sim, sim que ótimo” diz a moça. “O Randy fazia um pouco de tudo. Deixa eu te mostar.” Abre o catálogo. “Então o Randy fez estas fotos.” Dirigiu, você quer dizer? “Não o Randy fotografou mesmo. Você fotografa?”. Não, mas eu sei dirigir o fotógrafo. “Então, e estas bolsas, foi o Randy que fez a produção, montou o cenário, arrumou a bolsa e tal. Você produz suas fotos?” Não, mas eu sei dirigir o produtor. E o texto, eu apontei meio querendo mudar de assunto. “Ah sim, o Randy quem escreveu. Você escreve?” Escrevo mas eu tenho uma redatora no meu emprego atual, e eu a dirijo, (não é isto que a palavra direção, em direção de arte siginifica?).

Momento de silêncio. “Então, o Randy estava comentando outro dia como a pessoa que assumir o cargo tem que ser extremamente organizada. Tem vários prazos que tem que ser cumpridos, projetos diferentes que nós fazemos, departamentos diferentes que tem que ser envolvidos. Você é organizada?” Sim, sim, planilhas de Excel para tudo. Mas, sabe... no meu emprego atual nós temos um produtor gráfico que é responsável pelos prazos e ficar em cima dos outros departamentos. “Ok. Bom, teu portfolio é ótimo. A próxima entrevista será com o Randy.” Ah tá, o Randy né? Bem que eu imaginei.

Saí de lá, liguei para a agência que tinha me mandado na marca e disse que da próxima vez nem precisa me ligar. “Ah, você não gostou?” não, não gostei. Talvez seja por que eles tem um diretor de arte que faz o trabalho do fotógrafo, do produtor, do redator, só falta lavar e passar roupa para fora. E recebe o mesmo salário que eu. Isto é coisa para quem está desesperado. E eu que voltei do Brasil achando que as relações trabalhistas no mercado do profissional liberal ainda estavam congeladas no tempo. Minhas amigas contam histórias de arrepiar, chefes agindo como senhores feudais, “Como você ousa sair deste emprego?”, “O quê? Você acha que merece aumento?”. E deste lado de cá tudo que encontrei foi, “Boa sorte no seu novo emprego, estou feliz por você e triste por mim. Se você quiser voltar as portas estarão abertas.”, e o aumento é de praxe e anual. Sempre. A indústria é auto regulada. Por que se você não recebe ao menos uma correção monetária você muda de emprego. E tem oferta. E as pessoas pulam de um para outro e aviso prévio é avisar o chefe que na semana que vem você não vem mais. E todos trabalham muito mas dentro de certos parâmetros. Com exceção do Randy. Que faz tudo. Menos me entrevistar. Uma coisa a menos.